Elas também podem torcer
Lugar de mulher é onde ela quiser, mas algumas torcedoras ainda temem pela segurança nos estádios de futebol
Marcela Corrêa/Timbuzeiras. Foto: Arquivo pessoal
A estudante de Direito Marcela Corrêa define o que é torcer por um time de futebol com brilho nos olhos: “É prestar apoio, irradiar, captar a energia e mágica do momento. É ecoar em você cada grito e cada aplauso. Elogiar, apoiar na vitória e torcer pela recuperação diante das derrotas”. Ela é integrante do Timbuzeiras, grupo de torcedoras do Clube Náutico do Capibaribe, que surgiu de uma brincadeira no Whatsapp e hoje conta com 27 integrantes se apoiam, vibram e incentivam o clube.
Como torcedoras, as mulheres costumam ser questionadas como se tivessem a obrigação de mostrar que sabem e basta demonstrar um pouco de interesse pelo esporte para se deparar com o clichê machista: “então me diga o que é impedimento”? É certo que esse cenário vem mudando no país do futebol e o aumento da presença feminina no campo é notável.
A pesquisadora e escritora pernambucana Soraya Barreto é autora do livro “Mulheres no campo”, fruto de uma pesquisa fruto de sua inquietação como torcedora e apreciadora de futebol e com intenção de compreender quem são e como se comportam as torcedoras em Pernambuco e que percurso trilharam até se identificarem como tal.
Soraya afirma que houve uma mudança e inserção das mulheres no campo e destaca: “Não é que as mulheres não praticavam ou não torciam, tanto é que uma versão para a origem do termo “torcida” vem justamente da presença das mulheres no campo. Aqui no Brasil, no início do século XX, elas iam torcer por seus maridos e essas mulheres torciam lenços ou luvas na hora em que tinha algum lance mais interessante que poderia ser gol. Esse ato levou a se chamar o ato de torcer, torcida, torcedor e torcedora. A partir do momento em que entram homens de outras classes, outras raças, para jogar futebol, as mulheres de “boa” família, como eram consideradas, eram afastadas dos campos e do futebol. Então a gente justifica o porquê dessa invisibilidade”, explica.
Thais Villar. Foto: Arquivo pessoal
Sobre o assunto, a estudante de jornalismo e torcedora do Sport Clube do Recife, Thais Villar, destaca: “Infelizmente é bastante notório que ainda há muito machismo no âmbito do futebol. Começando pelo fato das jogadoras de futebol feminino não terem a visibilidade e o reconhecimento que o masculino tem”, aponta.
A presença das mulheres em jogos de futebol vem numa crescente, prova disso é o resultado de um estudo realizado pelo Esporte Clube Bahia, em agosto de 2018. O levantamento mostrou que 69% das torcedoras do clube têm vivência de estádio e ainda 23% delas afirmaram ter sofrido algum tipo de discriminação nas arquibancadas por serem mulheres.
Em 2017 foi realizado o 1° Encontro Nacional de Mulheres de Arquibancada, no Museu do Futebol em São Paulo. Participaram cerca de 350 mulheres representando 50 torcidas, de 11 estados brasileiros, para trocar experiências e debater sobre o amor por torcer e a participação feminina dentro dos estádios.
Querer estar em campo para assistir uma partida de futebol não é algo restrito a homens, mas a presença delas ainda gera incômodo, assédio e comentários. Marcela Corrêa já foi vítima e descreve: “Muita gente já falou que eu não entendia de futebol, ou chamou de maria chuteira, porque infelizmente algumas pessoas ainda têm a mentalidade de que se a mulher gosta de futebol é para ir atrás de homem, ou agradar homem, e não é assim”.
A pesquisadora Soraya Barreto vê o aumento da presença feminina na arquibancada com entusiasmo. “Vejo um desenvolvimento, um cenário que se faz muito mais positivo para conquista desse espaço ainda tão negado às mulheres, devido à violência e ao machismo”.
Saiba mais…
“Atualmente tem uma melhora, podemos ver diversos grupos de torcedoras e mulheres conquistando seus espaços. E é muito gratificante ver que de certa forma está tendo uma melhora nesse ambiente”.
“Nunca passei por nenhuma situação de comentários machistas no estádio. Muito pelo contrário, já debati sobre o jogo com homens que estavam ao meu lado, vibrei junto com eles. Muitos já chegaram a me elogiar por me verem sozinha na arquibancada assistindo a partida”.
“Acredito que elas vêm conseguindo respeito. Não diria garantindo, mas vem conquistando respeito, através da luta”