Geisa Agricio
É gorda que chama
Geisa Agricio é pernambucana, tem 39 anos e atua como gerente de desenvolvimento institucional do Paço do Frevo, que é um espaço cultural dedicado ao ritmo musical, e na liderança de comunicação do Cais do Valongo, que é o porto que recebeu mais navios negreiros na América, ambos reconhecidos como patrimônio da humanidade. Além disso, é mãe, jornalista, mulher negra e reconhecidamente gorda há 5 anos. O fato de se reconhecer como mulher gorda há poucos anos, não a eximiu de sentir outras dores durante a infância.
A jornalista aprendeu com a família, desde cedo, a valorizar sua identidade de pessoa negra. Sua mãe elogiava a beleza dos cabelos e dos traços da filha, reforçando a percepção de que as pessoas são bonitas e não precisam se adequar aos padrões da branquitude. “Essa relação com o corpo na infância, era um sentimento de desajuste. Inclusive, eu falo dessa coisa até no mercado, é difícil gostar do próprio cabelo se não existe produto para ele, como dar jeito nele. Então, eu tinha que esconder minha natureza.
Entrevista com Geisa - Parte 1
Entrevista com Geisa - Parte 2
A prática do olhar sobre o próprio corpo foi um exercício que Geisa resolveu levar para a página @gordaquechama – perfil onde dialoga com sua amiga e jornalista Marta Telles. Assim, ela considera que ao se tornar uma curadora de novas possibilidades, ela abre espaço para discutir temáticas sobre gordofobia, pressão estética e empoderamento partindo da sua vivência, como também para chamar a atenção daquela amiga que é magra ou daquele namorado tóxico que vivem de discursos violentos sobre o corpo gordo.
Entrevista com Geisa - Parte 3
Ela entende a importância de existirem cada vez mais essas mulheres que trazem seus corpos de formas reais, sem filtro, alterações e que espalham a mensagem do corpo livre, mas também sabe que a falta de acesso de pessoas gordas às posições de poder ainda é o grande problema. “A gente gasta gerações e muitos recursos emocionais, físicos, financeiros e sociais desperdiçados nesse movimento de insatisfação. Na verdade, eu desisti de gastar o meu tempo brigando com isso e de focar em outras coisas, outros ganhos que eu posso ter além da grande vitória de conquistar um corpo que eu nem sei mais se é bonito.”
Entrevista com Geisa - Parte 4
Dessa forma, Geisa acredita que as mulheres gordas nunca serão vistas como o padrão ideal de beleza – esse não é o ponto da questão. Mas sim, entender como esse padrão é utilizado e comercializado para que a mulher coloque aquilo como a sua meta de vida. Existe um mercado movimentado por esse padrão, de moda, produtos estéticos e até um estilo de vida fitness. Uma das formas que ela tenta combater essa monopolização, é através de seu consumo consciente. Segundo a pesquisa global da Accenture Strategy, 83% dos consumidores brasileiros preferem comprar de empresas que defendem propósitos alinhados aos seus valores.
Além de estar atenta aos posicionamentos das empresas, os espaços que não tem mulheres gordas, pretas, indígenas, LGBTQIA + precisam ser chamados à atenção, para então as pautas sobre gordofobia, machismo, racismo, etc. serem trabalhadas diariamente. “Eu como pessoa preta fico no incômodo onde trabalho, trabalhamos negritude, diversidade, vários projetos… Mas a gente tem negros na liderança?”. O Perfil Social, Racial e de Gênero do Instituto Ethos realizado em 2019 aponta que pessoas negras ainda são sub-representadas no mercado.