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História mal contada da luta pela sobrevivência e direitos

Não existem relatos exatos sobre a história da sexualidade da mulher PCD. O que encontra-se são narrativas separadas entre gênero, sexualidade e deficiência. Essa visão histórica é tão nebulosa que há uma necessidade de repartir o olhar sobre o assunto, para que entenda-se como e o porquê delas serem tão esquecidas socialmente.

Primeiro é essencial pensar o quanto foi dolorosa a construção social das pessoas com deficiência. De acordo com o professor de História Talmon Trajano, o grupo PCD carrega um peso histórico de enorme rejeição, sendo julgados por serem quem são, sofrendo diversos estigmas. “A história da pessoa com deficiência é muito recente. Isto se dá pelo fato de que no período da Antiguidade os únicos relatos dessas pessoas na sociedade eram a tentativa de extingui-las cruelmente. Enquanto os escravos estavam lutando por sua liberdade, a pessoa com deficiência ainda era assassinada pela própria família,” afirma.

Também é fundamental olhar de perto a história da sexualidade da mulher, já que por muito tempo esta era tratada como algo proibido e promíscuo pela sociedade. De acordo com a historiadora Fátima Seabra, a construção histórica da sexualidade da mulher foi de grande repressão e perseguição social. No vídeo a seguir, ela ressalta como eram as dificuldades dos grupos femininos em reivindicarem sua sexualidade, além dos estigmas sociais da época diante das mulheres com deficiência.

Foto de Arenilda sentada sorridente em sua cadeira de rodas
De acordo com a pedagoga e especialista em gênero e deficiência, Arenilda Duque da Silva, essa construção social ainda conduz o grupo feminino PCD à marginalização. Segundo ela, por diversas vezes, este processo exclui a mulher e enxerga apenas a deficiência de seus corpos.
Sabe-se que algumas visões históricas sobre a sexualidade da mulher com deficiência surgiram a partir dos dogmas religiosos que comandaram durante séculos o cenário social. Com a evolução da sociedade, as religiões também tiveram que adaptar-se a uma nova estrutura. Desta forma, as convicções religiosas foram moldadas de acordo com transformações sociais. Ao refletir-se sobre esses avanços, como está a visão sobre a sexualidade das mulheres com deficiência nas religiões,nos tempos atuais?

No vídeo a seguir, quatro líderes religiosos de diferentes doutrinas contam como sua orientação religiosa observa o tema:

Da opressão à liberdade:
As batalhas diárias pelo direito
ao empoderamento sexual.

 
Por muito tempo, sexo e deficiência eram pautas tão distantes que não faziam parte dos debates em torno da mulher com deficiência. Essa visão simplista está diretamente ligada aos estigmas sociais que as mulheres PCDs encontram em relação a sua sexualidade.

Este grupo feminino sofre automaticamente uma dupla discriminação social. A primeira por ser mulher e a segunda por ser uma pessoa com deficiência. Esta visão está relacionada às questões de gênero, que ainda são fatores predominantes na formação social do ser humano. Esse cenário sexista em relação às mulheres PCDs apresenta-se de forma expressiva na população brasileira. De acordo com o IBGE, cerca de 6,4% dos habitantes têm algum tipo de deficiência, seja ela: física, auditiva, visual, intelectual ou múltipla. Porém, a grande maioria PCD é composta por mulheres que são invisibilizadas e mal representadas.

Mesmo sendo a maior parte do grupo PCD, as mulheres com deficiência se sentem excluídas e convivem muito mais com o capacitismo do que os homens. Elas são representadas de forma limitada e rotulada, já que a cultura capacitista torna muito mais evidente os estigmas em relação ao papel da mulher na sociedade. De acordo com a socióloga Vera Borges, os estereótipos pré concebidos referentes a mulher estão diretamente ligados à cultura patriarcalista. No vídeo abaixo, Vera também reitera a necessidade de um cuidado maior sobre a sexualidade das mulheres PCDs, para que elas não sejam objetificadas pelo machismo.
A rotulação capacitista não enxerga que a mulher PCD exala sentimentos, os quais a levam a sonhar, namorar, casar, construir, desconstruir e viver além das suas limitações. Essa é a realidade de Lilian Lima. Diagnosticada com Esclerose Lateral Amiotrófica, desde muito nova sente-se rejeitada pela sociedade por ser uma mulher PCD. “Sou uma mulher com deficiência, mãe, preta e pobre. Os estigmas para mim são múltiplos. Quando tive meu filho, me disseram que eu não poderia cumprir meu papel de mãe, pois não conseguiria lavar um prato, fazer o almoço ou varrer a casa. Minha maternidade foi reduzida a simples trabalhos domésticos, isso é o que o capacitismo faz. Contudo, dei todo o meu amor ao meu filho, independente da minha deficiência. Sou uma mulher como qualquer outra, com desejos e fetiches, porém quando quero me aventurar na minha sexualidade não consigo achar muitos motéis acessíveis,” criticou.

A deficiência às vezes é algo inesperado para uma mulher e pode chegar em qualquer fase da vida. Esse novo cenário traz a necessidade de aprender a conviver com limitações físicas, além de ter que suportar um novo olhar da sociedade sobre elas. Reescrever uma nova história é o que Mirelly Almeida Xavier faz todos os dias depois de receber o diagnóstico de paraplegia, após um acidente automotivo. Para Mirelly, as maiores dificuldades enfrentadas depois de tornar-se uma pessoa com deficiência são os estigmas sociais em relação a nova condição física. Ela também relata as experiências e superações depois do final conturbado de seu relacionamento, no vídeo abaixo:

Essa também é a realidade de Josenilda Julia Pereira, que tornou-se uma pessoa com deficiência após um Acidente Vascular Cerebral. A história de Júlia começa na Alemanha, quando seu então marido a abandonou após ter contraído hepatite B. Forçada a voltar para o Brasil, Julia sofre o primeiro AVC. Mais de dois meses em um hospital e com o lado esquerdo do corpo totalmente paralisado, ela teve que reinventar seu jeito de viver:

Os estigmas em torno das mulheres com deficiência também estão presentes no meio artístico. De acordo com agência Head, a representatividade de pessoas PCDs em comerciais brasileiros não chegou a 0,12% no último ano. Um outro estudo, o Diversity and Social Change Initiative, analisou os 100 principais filmes lançados em 2015 e percebeu que o número de personagens com deficiência foi de apenas 2,4%. Já na música, poucas são as artistas com deficiência que conseguem alcançar alguma representatividade na mídia. Porém, esses números não representam a classe PCD que existe no meio artístico:

Esse é o caso de Amanda Lyra. Mulher PCD, cantora, produtora musical e CEO de uma empresa de publicidade, ela luta em busca do empoderamento e visibilidade das mulheres com deficiência. No vídeo abaixo, Amanda relata como é ser uma artista com deficiência, além da trajetória até a sua conquista pelo empoderamento sexual.

A visão capacitista também é recorrente no universo da moda. Isto é causado pela baixa representatividade dos corpos femininos PCDs, desde o processo de criação dos designers até o desenvolvimento de grandes desfiles e lojas de departamento. No entanto, essa realidade tem mudado através da moda inclusiva. A categoria surgiu em 2008 e tem o objetivo de integrar as pessoas com deficiência no universo fashionista. De acordo com a estilista e especialista em pesquisa e desenvolvimento de roupas para pessoas com deficiência, Drika Valéria, as roupas adaptadas conseguem dar poder para mulheres PCDs. No vídeo a seguir, Drika também ressalta a importância da Moda Inclusiva e conta como o mercado fashionista enxerga as mulheres com deficiência.
A partir deste cenário, várias iniciativas foram criadas em prol do empoderamento das mulheres com deficiência. Uma dessas iniciativas é o projeto Eficientes http://www.eficientespcd.com.br/ , que tem como objetivo informar as pessoas PCDs e mostrar a importância da integração delas na sociedade. No vídeo abaixo, a jornalista e uma das fundadoras Larissa Pontes, relata como surgiu o projeto e como este ajuda no empoderamento do grupo PCD.
As batalhas diárias que as mulheres com deficiência enfrentam para terem o direito a viver a sexualidade, muitas vezes são deslegitimadas, por serem mais uma vez estigmatizadas como incapazes. Contudo, é necessário desconstruir o discurso capacitista e resignificar o olhar da sociedade sobre elas.
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