Histórias para
escapar da realidade

Durante o isolamento social da pandemia, editoras surgiram, investindo em livros que estimulam jovens a viver ficcionalmente seus próprios universos 

Em novembro de 2021, quase dois anos depois do impacto da pandemia de Covid-19 e do isolamento social decorrente dela, o grupo BTS lançou o álbum BE, que faz referência a esse período pandêmico e conta com a participação ativa dos sete integrantes do grupo na sua produção. Em uma das faixas do disco, os intérpretes relatam sentimentos frustrantes e apontam como uma das soluções para isso transformar seu quarto no seu próprio universo, encontrando, assim, pontos positivos no isolamento. Vemos isso nas primeiras estrofes da canção Fly to my room:

“Todos os dias

 São tão sufocantes que estou ficando louco

 Parece que ainda é o primeiro dia

 Alguém poderia voltar o relógio? 

O ano inteiro foi roubado

Eu ainda estou na cama

Me sinto um pouco doente

Isso está me matando aos poucos 

Não importa como 

Eu quero sair, de qualquer jeito

Bem, não tem jeito

Esse quarto é tudo o que eu tenho

Então, acho que vou ter que 

Transformar ele no meu próprio mundo.”                     

Se podemos tirar vantagem do isolamento e da nossa permanência em casa – realidade cada vez mais distante neste 2022, com a volta às atividades regulares graças à vacinação massiva –, uma delas foi poder reaver hábitos deixados para trás, por falta de tempo e cansaço, como a leitura diletante. Mesmo com a existência de blogs e canais no Youtube que já produziam conteúdos literários, o sucesso do Tiktok e da tag #Booktok foi um dos motivos do aumento no número de leitores jovens, sobretudo durante a pandemia. 

Em uma pesquisa divulgada pelo Kantar Ibope, a rede social teve mais de 2 milhões de downloads e cresceu 35% no quesito popularidade entre os jovens e adolescentes. A repercussão de divulgação de livros no Tiktok ganhou tanta influência, que até livrarias renomadas ao redor do mundo, como a norte-americana Barnes & Nobles, passaram a dedicar prateleiras de suas lojas a destacar livros que fazem sucesso no aplicativo. Isso demonstra o quanto retomar esse hábito, e até mesmo adquiri-lo, foi reconfortante durante a crise sanitária mundial. E isso inclui, claro, os variados grupos de fãs.

 

Novas Editoras

De acordo com pesquisa realizada pela Nielsen BookScan e divulgado pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL), no primeiro semestre de 2021, houve um aumento de 48,5% na venda de livros em comparação a 2020. Acredita-se que o crescimento do mercado literário tem também influência do surgimento de novas editoras no Brasil e do uso de plataformas de leitura online, como o Wattpad.

Entre as inúmeras atividades que o fã pode desempenhar, uma delas é escolher, entre as ofertas do mercado editorial, suas histórias favoritas em formato de livro físico.  A editora Euphoria, por exemplo, foi criada em 2020 por causa da paixão da N. Belikov, fundadora e autora de obras como Assombrado e Endiabrado, por fanfics do septeto BTS. Contando com nove colaboradores fixos, N. Belikov declara que tudo que diz respeito à editora tem muita influência do BTS, já que a maior parte de suas publicações tem sido fanfics do grupo. 

Por não fazerem parte do mercado editorial tradicional, editoras como a Euphoria, Violeta e Mikrokosmos ainda ocupam um espaço pequeno. Ao ser perguntada sobre pontos positivos e negativos de ser uma editora independente, a fundadora diz que por ter um volume grande de tarefas, acaba sobrecarregando um pouco todo mundo, além de afetar o capital de giro da empresa, que é essencial para novos investimentos. Como ponto positivo, ela acredita que seja a relação mais intimista com o público. 

Se observarmos, a maioria das obras publicadas, tanto pela Violeta quanto pela Euphoria, são de fanfics LGBTQIA+. N. Belikov explicou o motivo pelo qual as publicações da editora tratam dessa temática.

“Mesmo que a comunidade LGBTQIA+ no Brasil seja enorme como é, ainda não temos tanta facilidade em encontrar coisas focadas apenas para esse público, principalmente na literatura, onde os maiores sucessos e clássicos têm tão pouca representatividade LGBTQIA+. A Euphoria nasceu com a ideia de ser um espaço seguro e livre para pessoas que precisam se ver representadas.” 

Há outras editoras que estão chegando agora no mercado editorial, e elas compartilham uma semelhança: apoiar autores iniciantes a realizar seu sonho de ter uma publicação, e dos leitores de terem suas histórias favoritas na sua cabeceira. Então, para acompanhar o trabalho de outras editoras independentes é só clicar nos ícones abaixo.

Fanfics que viraram livros

Fanfiction, do inglês ficção de fã, é um gênero literário muito conhecido. No exterior, por exemplo, duas histórias que se tornaram best seller antes eram fanfics, elas são: 50 tons de cinza, de E. L. James, e After, de Anna Todd. No Brasil, graças a iniciativas das editoras independentes, vários ARMYSNome oficial dos fãs do BTS, também é conhecido pela mídia ocidental como BTS ARMY. estão podendo ter suas histórias em mãos. Geralmente as narrativas são construídas tomando como base nomes e características de determinados artistas. As que são de temáticas LGBTQIA+ e sobre grupos de K-pop, por exemplo, acompanham outra questão bastante discutida entre fandoms: o ato de shippar, ou seja, torcer pelo relacionamento amoroso dos ídolos.

Há muito tempo que surge a demanda diretamente dos leitores de querer a sua fanfic favorita no formato de livro físico. Antes de pensar em fechar com uma editora, a autora de Incognito, Larissa Lair, publicou de forma independente, em 2020, o romance de Taekook (Taehyung e Jungkook, do BTS). Larissa conta que, mesmo estando no meio da sua pós-graduação, ainda assim ela ficou à frente de todo o processo de edição do livro e percebeu na pele que não é fácil, demandando muita dedicação. 

“Um pouco antes de terminar a fanfic eu fiz uma pesquisa no Google Forms para saber quem tinha interesse em ter o livro físico de Incógnito, e umas 300 pessoas responderam que queriam. Aí comecei a fazer orçamentos, porque, quando você vai fazer uma publicação independente, você é a autora e a editora. Então tem que entrar em contato com preparador de texto, revisor, com designer, ilustrador, capista, com diagramador que, por sorte, não precisei, pois sei diagramar. Fora a questão financeira, do transporte – com os correios e atendimento, porque tinha muita gente querendo. Foi uma grande aventura, mas eu queria fazer do meu jeito, então não mudei os nomes nem nada. Essa edição foi uma forma de agradecimento para meus leitores que me acompanharam por quatro anos e não me abandonaram”, conta Larissa Lair, autora de Incognito

Por ser algo especial para os fãs, por questões de direitos autorais ou de personalidade, não é possível vender obras que tenham o nome de famosos. Dessa forma, todo o processo de adaptação traz mudanças. Mas isso não quer dizer que os novos leitores ou os que não conseguiram a primeira edição física não vão poder adquirir uma versão nova do livro. Incognito foi relançado em maio de 2022 em versão física, dessa vez pela editora Violeta, e teve sua pré-venda iniciada no dia 20 do mesmo mês. 

Recentemente, outra fanfic que passou pela adaptação foi Duplex. Escrita por Gabriella Martineli, de 24 anos, a história foi publicada através da editora Euphoria, com personagens baseados nos integrantes dos grupos BTS e TXT. Ambientada no omegaverse, subgênero de ficção em que a relação social no universo é baseada na matilha de lobos, Duplex surge nesse meio onde humanos são híbridos de lobos e aborda o romance entre Adrian e Maximilian (Jungkook e Taehyung, na fanfic), junto com seus mini prodígios Noah e Daniel (Soobin e Yeonjun, na fanfic). 

Dividida em dois pontos de vista, as versões físicas de Duplex começaram a ser vendidas no site da editora em março de 2022. Em uma entrevista para o B-ARMY Newsverse, Gabriella comentou o caminho para que sua obra chegasse em formato real. 

“O processo para a adaptação de Duplex para livro físico foi incrível. Eu gosto de ler e reler minhas obras e, enquanto mexia em Duplex, eu enxergava como consegui escrever uma história incrível. A editora me recebeu muito bem e o contato com eles foi super natural — eu também sou um pouquinho cara de pau e corri atrás do meu sonho”, resume Gabriella Martineli. 

Gabriela nunca pensou que conseguiria publicar uma história sua, e agora que recebe vários feedbacks positivos pela sua escrita, ela já escreve algo pensando em tornar livro. 

“Eu pretendo transformar todas as minhas fanfics em livros, caso isso seja possível. Depois de Duplex, a mais próxima a conseguir isso é Pas de Deux, que já está cotada com a Euphoria. Espero muito conseguir Florescência, por ser um spin off de Duplex, e também Off the Rails, fora as minhas oneshot de terror, que acredito que daria uma coletânea bem legal!”, antecipa.  

Para ter acesso às entrevistas com algumas autoras de fanfics, acesse aqui.

Há diversas outras fanfictions que viraram livros e que são reconhecidas no fandom ARMYNome oficial dos fãs do BTS, também é conhecido pela mídia ocidental como BTS ARMY., como: Dezessete Mil Sentidos para Benjamin Park, Cem Chances, Croack e Sangue Latino, todas publicadas pela editora Violeta. Temos também o Box de Cherry, Polêmico e Adicto, que estão disponíveis no site da editora Euphoria. 

Além de ser ARMYNome oficial dos fãs do BTS, também é conhecido pela mídia ocidental como BTS ARMY., também sou fanfiqueira, por isso, encerro esta reportagem com indicações de fanfics do B-ARMY Newsverse indica: