No leilão da Christie’s realizado em outubro de 2018, em Nova York, apresentou-se ao mundo o Portrait d’Édouard Belamy (2018), pintura que na ocasião buscou seu brilho entre obras de nomes como Banksy e Jeff Koons. Numa noite surpreendente, a peça assinada pelo coletivo Obvious foi a segunda melhor venda do evento, sendo arrematada por um comprador desconhecido pelo valor de US$ 432.500 (aproximadamente R$ 2,2 milhões), número 40 a 60 vezes maior que o seu valor inicial estimado (algo entre US$ 7.000 e US$ 10.000, de acordo com o El País). O quadro perdeu apenas para uma série de serigrafias de Andy Warhol, leiloada por aproximadamente US$ 780 mil. A tinta que descansava sob a tela dando forma a um retrato abstrato não havia sido manejada mãos humanas, mas por um sistema de Inteligência Artificial que trouxe para si os olhares do mundo da tecnologia e da arte, despertando deslumbre e preocupações.
A peça, cuja produção se iniciou cerca de nove meses antes do leilão, foi criada por Hugo Caselles-Dupré, Pierre Fautrel e Gauthier Vernier. O trio se conheceu em um colégio parisiense e, através da curiosidade sobre a possibilidade de uma inteligência artificial criar arte, montaram um coletivo com o objetivo de transformar códigos em produtos artísticos. Com o sucesso do Retrato de Édouard Belamy (tradução do francês), a série foi continuada com a produção de mais retratos, responsáveis por costurar uma árvore genealógica de uma fictícia família aristocrata francesa clássica. A criação de obras como os retratos da família Belamy despertaram de imediato críticas sobre o papel do artista, com o principal argumento de que o novo método criativo o substituiria. Em sua defesa, o Obvious compara a reação da classe artística e da sociedade a esta nova tecnologia com uma reação semelhante ocorrida no início do século 19, quando a fotografia começava a tomar forma na França com as inovações de Joseph Nicéphore Niepce (1765-1833) e Louis Jacques Daguerre (1787-1851).
“Nós acreditamos que esse medo vem da desinformação, assim como da nossa resistência natural à mudanças. Pode ser interessante comparar isso com o avanço tecnológico impactante anterior com relação à produção artística: a fotografia. As mesmas críticas foram feitas quando a fotografia surgiu. ‘É borrado’, ‘vai substituir os artistas’, ‘é reservada para engenheiros qualificados’, diziam. Acreditamos que a IA terá aproximadamente o mesmo impacto, criando um novo e distinto movimento artístico, permitindo que pessoas com diferentes habilidades tenham uma forma de expressão artística”, comenta Gauthier Vernier, que representou o Obvious em entrevista.
Liz Ribeiro, cientista social e pesquisadora de arte robótica, comenta em consonância Gauthier Vernier: “Certamente o advento das inteligências artificiais que criam obras de arte trará novas possibilidades na criação artística embora eu não acredite que seja algo ser ‘temido’. Desde seu princípio, a arte contemporânea vem revolucionando todos os âmbitos da criação artística. A própria definição de arte é questionada, o lugar do artista, o que é inspiração, dom, talento, onde a arte deve ser exposta, como é vendida, os materiais e meios de criação etc. As inteligências artificiais vêm – da perspectiva de uma antropóloga, importante ressaltar – para se somar a essas já intensas revoluções que a arte contemporânea nos proporcionou. Os artistas humanos terão, novamente, que se adaptar”, aposta.
Desde que foi aceita como uma invenção, em 1839, a fotografia ainda teve que percorrer um longo caminho até ser reconhecida como arte, enfrentando grande resistência e sendo alvo de debates em revistas europeias e estadunidenses até encontrar na população em geral um mercado a ser explorado pela indústria. À época, o francês Charles Baudelaire não poupou críticas à técnica.
Ele considerou que a função da fotografia seria meramente instrumentalista e não deveria adentrar no terreno da arte. “A indústria, ao irromper na arte, torna-se sua mais mortal inimiga, e a confusão das funções impede que nenhuma delas seja bem preenchida. (…) Se for permitido à fotografia substituir a arte em algumas de suas funções, ela logo a suplantará ou corromperá inteiramente, graças à aliança natural que encontrará na tolice da multidão”, escreveu o pensador.
A discussão vai além e ganha contornos filosóficos quando se entra no campo conceitual. O conceito de arte não é um consenso, assim como o de inteligência, como explicou o filósofo João de Fernandes na primeira parte desta reportagem. Vale ressaltar que indivíduos inteligentes nem sempre se comportam de maneira inteligente, da mesma forma que a arte pode ser feita de maneira não consciente ou deliberativa. Para o Obvious, a própria voluptuosidade dessas definições abre espaço para descobertas de novas formas de se pensar a arte e o artista.
“Para nós, arte é uma noção que não pode ser definida, pois ela mesma não reconhece fronteiras. Nós acreditamos que arte pode ser considerada qualquer coisa, desde que ela transmita emoção, seja a partir de uma aproximação artística ou até puramente visual. Trabalhar com essas noções que são dificilmente definidas corretamente nos permitiu criar uma ponte. Nos permitiu trazer a inteligência artificial para o mundo da arte, ao mesmo tempo que colaboramos para trazer a criação artística para o mundo da pesquisa”, reflete Gauthier Vernier.
Essa criação artística se dá, na maioria dos projetos, através de uma rede neural chamada GAN, apelido para Generative Adversarial Networks (Redes adversas generativas, em português). Tratam-se de algoritmos capazes de criar um produto novo (no caso, uma imagem) e único a partir de um largo número de exemplos. O processo tem início com a definição de um objeto a ser retratado e, então, alimenta-se essa base de exemplos com informação. No caso do Obvious, com imagens sem direitos autorais ou imagens cedidas através de parcerias. Então, trabalha-se o algoritmo para que ele, a partir dos exemplos, crie uma versão que se adeque ao objeto almejado em uma metodologia de tentativa e erro.
Uma vez que a versão do resultado provida pelo algoritmo seja satisfatória, selecionam-se as imagens que se adequam melhor à mensagem artística. O Portrait d’Édouard Belamy é filho do GANs, assim como toda a sua família. No site, as artes visuais são acompanhadas por frases dos indivíduos fictícios retratados através do mecanismo.

Um sistema semelhante de inteligência artificial, lançado em maio último, foi batizado de Jukebox. Essa rede neural deu à luz uma versão da música Toxic (In the zone, 2003), de Britney Spears, na voz de Frank Sinatra (1915-1998). Além do ícone dos anos 40 e 50, outras vozes foram “revividas” e deslocadas para outros ritmos e tempos, como Elvis Presley e 2pac. Esse projeto faz parte da organização sem fins lucrativos OpenAI, que busca, através de código aberto, assegurar que o desenvolvimento da IA beneficie toda a humanidade.
O campo do cinema também não está longe do alcance da inteligência artificial. Em 2016, a parceria entre entre o cineasta Oscar Sharp e o pesquisador Ross Goodwin resultou no primeiro filme com roteiro desenvolvido por um programa de inteligência artificial. Estrelado por Thomas Middleditch, Sunspring é um curta de ficção científica que circulou em diversos festivais e, por onde passou, levantou discussões sobre sua validação enquanto produto artístico. O processo foi similar ao utilizado pelo Obvious e Jukebox: uma rede neural Long short-term memory foi alimentada com uma base de milhares de roteiros, que gerou um novo produto.
À primeira vista, o curta – filmado sem qualquer alteração do roteiro “original” gerado pela Inteligência Artificial – parece exibir oito minutos de pura confusão. Somos introduzidos no meio do que parece ser uma discussão de relacionamento entre H (Thomas Middleditch) e H2 (Elizabeth Grey), interrompidos pela chegada de C (Humphrey Ker). O diálogo aparentemente desconexo confunde o espectador à medida que H fala sobre uma coisa enquanto H2 e C aparentam falar sobre outra. A conversação, porém, evolui e chega num ponto de quebra da quarta parede por H e, posteriormente, por H2, que faz uma espécie de confissão sobre os objetivos do suposto parceiro. Numa segunda vista, percebe-se que os diálogos podem fazer sentido levando em consideração a capacidade de dedução do usuário e a não necessária coerência e clareza do cinema comercial.
Confira na íntegra o curta:
A arte como termômetro e lente de análise para a Inteligência Artificial
Iniciativas como os quadros da Obvious, as canções e faixas desenvolvidas pelo Jukebox e o roteiro de Sunspring são uma espécie de termômetro no mundo da arte para o tipo de tecnologia que vem sendo desenvolvida por cientistas da computação. Mas a arte, no seu papel inerente de mediadora entre a realidade e a nossa interpretação dessa realidade, pode assumir um papel de lente através da qual novas perspectivas possam ser trazidas ao debate tecnológico. Bruno Moreschi, artista visual e um dos coordenadores do instituto INOVA USP, junto com Gabriel Pereira, PhD em formação em Estudos da Informação e Design Digital na Universidade de Aarhus (DK), desenvolveu em 2017, na Holanda, um projeto chamado Recoding Art.
Trata-se de uma iniciativa que buscou entender como a visão computacional enxerga obras de arte. Para isso, inseriram as 654 imagens de obras exibidas na mesma exposição, do Van Abbemuseum, em Eindhoven, em uma plataforma criada por Gabriel, que juntava sete visões computacionais de diferentes inteligências artificiais de empresas líderes no mercado de tecnologia, como Google. Dessa forma, todas as imagens eram lidas por todas as inteligências, gerando 55.590 resultados. A maioria das leituras foi errônea, da perspectiva humana, pois muitas vezes as IAs confundiam os objetos das fotos. Esses erros, porém, revelaram como as inteligências artificiais funcionam com relação à sua interpretação.
“Nos baseamos numa técnica chamada estratégias oblíquas. Quando jogamos essas obras de arte, tivemos esses milhares de resultados e tentamos entender o que esses erros estavam dizendo em relação a como os algoritmos foram criados. Em alguns casos que tinham uma imagem de uma mulher, por exemplo, a IA do Google lia como algo mais ‘atrevido’ ou ‘erótico’, o que acontecia menos com fotos masculinas. Isso diz que o banco de dados que treinou essa IA estava enviesado. A gente também viu que quase todas as obras de arte eram lidas como produtos triviais de consumo, tipo cortina, sofá, almofada e coisas que você compra. Ela lê quase tudo como produtos e coisas potencialmente comerciais. E o resultado poético eram coisas inesperadas, mas que ajudavam a compreender a obra ou a ideia de arte. Por exemplo, quando colocamos algo com uma moldura evidente, a IA lia como uma janela. Isso é interessante artisticamente. Com esse resultado, criamos o artigo e o curta documentário”, explica Bruno Moreschi.
O artigo pode ser acessado aqui. Bruno concedeu à reportagem acesso ao curta documental e, além de expor o resultado e os questionamentos da pesquisa de forma mais digestível para o público leigo, o filme vai além de um artigo em formato de vídeo, tendo sua evidência enquanto produto artístico reconhecida por eventos como o Festival Internacional de Documentários de Amsterdã, Festival Hotdocs e o É tudo verdade. Trata-se de uma metalinguagem, arte sobre arte, provocando reflexões profundas sobre a construção imagética digital da nossa contemporaneidade. Infelizmente, ainda não está aberto ao público. Mas o usuário poder conferir a inteligência do Google Cloud Vision através deste link. Basta fazer o upload de uma imagem em seu computador na área “Try the API” e o mecanismo vai analisar o conteúdo do arquivo.
“Uma vez atingido o objetivo de analisar e entender como que esses dados são estruturados, catalogados e enviesados e visualizar como a IA nunca é neutra, nos interessamos em entender como esses resultados apareceram ali e quem os catalogou. A inteligência artificial não parte do nada, não adianta jogar uma foto numa rede neural, pois ela não vai fazer nada. Você tem que criar as tags, que é um trabalho humano, e só aí ela faz a o processo automático. Dessa forma, chegamos no ponto de camadas humanas e vimos trabalho precarizado”, comenta Bruno Moreschi. Essa camada de trabalho humano precarizado é feita por trabalhadores chamados de Turkers, em referência ao falso autômato criado por Von Kempelen (veja a linha do tempo na introdução da reportagem).
Os Turkers são trabalhadores da plataforma Mechanical Turk, um serviço de realização de micro-tarefas por demanda da Amazon cuja premissa é a seguinte: um indivíduo ou empresa (chamado de solicitante) lança uma tarefa (chamada de human Intelligence task) na plataforma e estabelece um preço (mínimo US$ 0,01 por tarefa), enquanto os turkers selecionam a atividade que julgam valer seu tempo de trabalho. Os solicitantes e os turkers, assim, são uma espécie de clientes da Amazon.
As tarefas geralmente são tediosas, como catalogação de imagens em um processo semelhante ao Completely Automated Public Turing test to tell Computers and Humans Apart (CAPTCHA), no qual usuários apontam em que locais objetos estão presentes em uma determinada imagem. Mais importante, essas atividades não poderiam ser feitas inicialmente por máquinas, mas são amplamente utilizadas para treiná-las. A estrutura da plataforma é criada para que não haja contato entre os trabalhadores, de forma que sua organização enquanto grupo não é possível. Dessa forma, solicitantes acabam explorando essa classe e os valores finais dificilmente ultrapassam US$ 2 por hora.

Ao final do documentário Recoding Art, os pesquisadores entrevistaram alguns turkers para entender como eles fazem suas escolhas. Para isso, fizeram uma solicitação com imagens da coleção do Van Abbemuseum em um formato de survey no qual eles deveriam descrever as imagens e se consideravam o objeto retratado como uma obra de arte.
“Em termos de obra de arte e catalogamento, os turkers são os grandes responsáveis. No início da IA tivemos um monte de gente com diversas ideologias e opiniões catalogando essas imagens. Indiretamente, todas as rotulações, em alguma instância, foram interpretadas por humanos em condições precárias de trabalho. O campo da imagem contemporânea passa por essa mediação de um trabalhador remoto, o qual diz se isso é arte ou não, se é importante ou não, se é violento ou não ou até se é pornográfico ou não. (…) Esse trabalho mostra como esses processos, que muitas vezes o campo da engenharia e automação vendem como totalmente automáticos, não são tão automáticos assim. São máquinas alimentadas por humanos inteligentes e precarizados, na maioria das vezes. E não é só para treinamento. Tem plataformas de inteligência artificial que usam esses turkers para a própria manutenção. Essa ideia cinematográfica de IA autônoma não é verdade, pois ainda temos muito o que aprimorar. Talvez seja mais correto falar em burrice artificial. Não tem nada a ver com o cérebro humano, é algo estatístico”, explica Bruno Moreschi.
O filósofo João de Fernandes compara os processos de aprendizado artificial e humano: “O aprendizado humano é circunstanciado e mediado por emoções. Alfabetizar uma pessoa é um processo lento e trabalhoso. Muito diferente do aprendizado de máquina, que se baseia em algoritmos. A inteligência artificial se baseia no desenvolvimento de softwares que aprendem e, também, no aperfeiçoamento das redes neurais. Esses novos softwares são capazes de se reprogramarem a partir de dados disponíveis na internet e dos rastros digitais que deixamos ao usarmos mecanismos de busca, escrever e-mails, usar o WhatsApp, as redes sociais, consultar sites ou fazermos compras online. A pesquisa sobre algoritmos de aprendizado avançou nos últimos anos e sugere que, em princípio, esses softwares poderão desenvolver uma inteligência que pode se igualar ou até mesmo superar a inteligência humana”.
Se no campo das artes as críticas são mais enfáticas, o filósofo entende que as ciências humanas podem fazer bom uso da inteligência artificial e, principalmente, com Big Data. “Até agora o discurso das ciências humanas tem se concentrado em debates ideológicos. Nesse sentido, o uso de Big Data poderá ser uma revolução para as ciências humanas, pois permite uma coleta de dados rigorosa, estatísticas e modelos. É possível repensar vários métodos da política usando Big Data. O importante, daqui para frente, é superar um certo preconceito que o pessoal da área de ciências humanas tem em relação à tecnologia”, opina.
Outro projeto interessante de Bruno Moreschi aconteceu na 33ª Bienal de São Paulo. Chamada de Outra Bienal, a ação consistia na criação de um site-arquivo com audioguia de funcionários do evento sobre obras que eles gostavam ou não. Foi uma iniciativa para entender a visão de quem fazia a Bienal acontecer, mas não era visto como parte do cenário artístico, como seguranças, zeladores etc. “A experiência com IA foi no sentido de pegar todos os textos curatoriais e jogá-los em algumas inteligências que replicam textos de maneiras ligeiramente diferentes e espalham nas redes. É um processo muito comum para espalhar fake news, pois ela reescreve a partir de sinônimos. A gente jogava os textos e elas revelavam várias coisas interessantes. Por exemplo: ela lia ‘curador’ como ‘controlador’ ou como ‘selecionador’, ‘exposição’ como ‘evento’, ‘mercado de arte’ como ‘publicidade da mão de obra’. Funcionou para decodificar o sistema da arte com o da IA e entender o que há em comum entre esses contextos e revelar como, a partir desse vocabulário super específico, você consegue mascarar várias coisas, como os turkers e os guardas. Usamos a lógica de usar o IA para desmascarar a arte e vice-versa”, explicou o artista.
Um dos principais músicos do Recife, DJ Dolores já acompanhou diversas viradas culturais: na década de 80, esteve presente nas primeiras festas do pessoal que daria vida ao Manguebeat; contemporaneamente, se encontra nas principais plataformas de streaming e em diversas trilhas sonoras do cinema nacional. Seu álbum mais recente, Recife 19, é produto um produto pós-gênero, que parte das reflexões do passado e do presente, como nas canções A casta e Adilla’s Place, partindo para um afrofuturismo na faixa Exú ciborgue. Envolvido diretamente nas tecnologias musicais, o músico afirma que a inteligência artificial já faz parte da produção contemporânea. No Logic Pro X, ferramenta de produção musical da Apple, existe um recurso no qual é possível gravar uma faixa de voz e uma Inteligência Artificial ajuda o usuário criando recursos sonoros compatíveis.
Dolores, porém, é mais crítico com relação a tecnologias como o Jukebox: “Eu acho curioso, mas questiono se é arte, pois ele está tá copiando um padrão e não acho que isso seja arte. Claro que existe uma parte da produção artística que é mais operária. Como trabalho com cinema, componho também sob uma demanda específica, seja para um personagem ou cena. Acho que esse artista operário tem mais chances de ser substituído por uma IA, pois ele está lidando com padrões. Mas a parte da autoralidade, que você estuda pra desenvolver melodias e técnicas, essa parte a IA não é capaz de chegar. Ela chega pra criar produtos como um jingle ou um POP, cuja estrutura das músicas é muito parecida. Nesse tipo de coisa, que é um universo da funcionalidade e do sucesso, a IA pode derrubar várias pessoas. É como fazer um muro branco. Certamente um robô é mais perfeito que um pedreiro para isso, pois não exige invenção, é só colocar um tijolo em cima do outro com perfeição. Mas quando se trata de erro e aprender com ele, o ser humano sabe errar melhor”.
Moreschi, por fim, deixa uma reflexão sobre o papel da arte: “Não estou muito interessado em ficar deslumbrado com a tecnologia e a IA fazendo arte. Esse deslumbramento é muito perigoso, pois a arte tem uma capacidade muito grande de legitimação. Quando ela se aproxima, ela deve fazer de maneira crítica, para não cairmos num deslumbramento de um sistema que ‘cria’ algo que não passa de uma replicação de várias outras coisas, sem subjetividade. Estamos num momento que devemos usar a arte e outras áreas para discutir as implicações que as IAs estão trazendo ao mundo. Os engenheiros devem ser nossos aliados, e não inimigos. A partir do momento que as IAs passam a nos regular na vida, ela deixa de ser um campo técnico, pois influenciam nossa vida e trabalho. Estou mais interessado em entender essas estruturas e como elas não são exclusivas do sistema de IA. (…) O papel da arte é sensibilizar estruturas, mesmo as mais brutas e fechadas“.