Tik Tok: Filtros, trends & inseguranças

Sentimento de insuficiência, comparação, a vontade de ser outra pessoa, ter outro corpo, outra vida. Com o passar do tempo e o surgimento das redes sociais, esses sentimentos passaram a ser frequentes na vida dos usuários. Essas redes permitem que o indivíduo exponha sua vida e seu cotidiano de forma rápida e intimista. Um click e todos os seguidores estão sabendo o quê você está fazendo, comendo, vestindo, concordando, falando. Esse processo do que pode ser chamado de “midiatização da vida” tem provocado consequências mais profundas do que se imagina. 

Desde a criação de aplicativos como o Orkut, Facebook, Instagram e Snapchat, por exemplo, a comunicação tem se tornado cada vez mais democrática e, junto a ela, o poder de influência deixa de fazer parte apenas da grande mídia. Acima de tudo, os usuários aparentam estar cada vez mais ligados à imagem; não é de se espantar que os aplicativo mais baixados do último ano tenham sido justamente os que mais estão ligados ao audiovisual, como o Tik Tok. Com mais de 2 bilhões de downloads no mundo, o aplicativo é o primeiro a concorrer com o grupo Facebook Inc. de acordo com o Sensor Tower, como mostra a matéria do O Globo. Como esperado, o maior número de usuários pertence à faixa etária adolescente entre 13 e 17 anos. Em um levantamento recente da Hype Auditor, esses usuários representavam 40, 7% das contas registradas no Brasil. 

Esse boom foi registrado principalmente a partir de 2020, ano em que se decretou a pandemia da Covid 19 e pode ser explicado pela consequência da ociosidade na qual o brasileiro se viu obrigado a enfrentar no início deste cenário, como explica Gabriel Almeida, jornalista e social media. “As grandes marcas e artistas começaram a produzir conteúdos mais interativos, a fim de preencher aquela lacuna que ficou em aberto. O Tik Tok, por exemplo, oferece vídeos fáceis e curtos de fazer e consumir, de acordo com as preferências do usuário, tendo o algoritmo como uma estratégia desse consumo”. 

Comportamento da Nova Geração

Com o crescimento da rede, os milhares de influenciadores digitais inseriram seus conteúdos na plataforma, juntamente com os novos influencers que surgiram no site. Esses conteúdos, quando viralizam, são chamados de trends, termo que vem da palavra “tendência”, no inglês. Algumas trends famosas no aplicativo evidenciam o culto aos corpos magros, à pele branca, aos cabelos lisos, ao nariz fino e arrebitado. São milhões de likes e vídeos que circulam livremente na rede.

Na aba de comentários, além dos elogios, milhares de frases autodepreciativas. Cenário que espelha bem o poder que esses conteúdos têm em impactar esses usuários, podendo gerar gatilhos sobre a própria imagem. 
Esses comportamentos, em uma rede social na qual o público jovem soma 69% do número de usuários, são preocupantes, já que  nesse período, o corpo e a mente estão em desenvolvimento. “Eles podem se sentir influenciados porque o grande desejo nessa fase é a aceitação, o pertencimento em algum grupo, isso é ainda mais evidente na adolescência”, afirma a psicóloga Eliane Eli. “Como nas redes sociais costuma ser publicado apenas o que é lindo e impecável, isso pode levar à comparação e à insatisfação geral ao tentar atingir padrões inatingíveis”, complementa a psicóloga.

“Eu sempre me comparo às meninas dos vídeos, vendo as cinturas finas, as pernas malhadas, os cabelos sedosos e achando defeitos em mim.”

Alessandra Lacerda, 23 anos

Estudante

“Alguns conteúdos geram sim gatilhos em mim, e é difícil porque estou constantemente pensando na minha imagem e no meu corpo.” . 

Larissa Guimarães, 22 anos

Estudante

Outro fenômeno responsável pelo sucesso do aplicativo do Tik Tok é a vasta quantidade de filtros que possibilitam mudanças desde mudar a cor de pele, até afinar o nariz. Esses recursos deixam os rostos completamente simétricos, “perfeitos”, dificilmente é possível ver vídeos que sejam gravados sem algum desses efeitos.

“É muito comum que esses adolescentes e jovens adultos desenvolvam distúrbio de autoimagem, que persigam padrões inatingíveis e tragam dificuldade de aceitação do próprio corpo, impactos negativos sobre a autoestima e que leve a pensamentos perigosos à saúde mental”, ressalta a psicóloga Eliane Eli. Felizmente, é possível notar uma onda que vai contra esse movimento e que valoriza a imagem real desses usuários. A influenciadora Marielli Mallmann (@marielimallmann) publicou recentemente um vídeo na plataforma, mostrando uma evolução de seus dias sem utilizar filtros em redes sociais. Confira:

Ainda existe uma longa caminhada para diminuir os impactos deixados pelos padrões de beleza implantados na sociedade, que são reforçados nas redes sociais. No entanto, iniciativas como a do vídeo acima, mostram outras possibilidades. Existem pessoas que buscam provocar a reflexão e mudar a realidade na qual estamos inseridos, sem manipular a mensagem e a imagem que querem passar, valorizando o quê de fato é real. Cada grande movimento começa com um passo, e, só então, é possível reconhecer o “eu” real que habita em cada um, desmitificando a construção padronizada que esses meios implantam em nossas mentes. Sem medo e sem filtro.