Ravany Eu descobri a minha sexualidade de forma muito nova, eu acho que eu tinha doze, treze anos, eu já tinha interesse por mulheres e meu círculo de amigos da escola que ainda são de amigos hoje em dia eram pessoas muito abertas, quanto essa questão. Eu lembro que minha melhor amiga tinha tipo um jeitinho sabe de gay que falava assim a um jeitinho de gay. Então já tinha esses questionamentos, então não era um problema entre a gente, então foi tranquilo. Eu só fui perceber realmente e me denominar bissexual a partir dos quatorze, quinze anos, foi quinze mais ou menos. Como é ser uma mulher lgbtqia + , com deficiência, eu acho que eu tenho uma deficiência sensorial que não é reconhecida legalmente no Brasil, é parecida com a fibromialgia inclusive que existe todo uma PL para sanar deficiência, mas ainda não é reconhecida oficialmente. Apesar de em alguns locais ser colocada como deficiência, em algumas leis estaduais etc. Eu tenho uma deficiência sensorial chamada vulvodínia, que é um problema, que é uma dor. No caso, eu sei obviamente que deficiência não significa doença, mas algumas doenças podem ser caracterizadas enquanto deficiência, dentro de um contexto específico. Por exemplo, fibromialgia. E aí, vulvodínia é uma doença crônica que atinge os nervos da pelve e me causa dores todos os dias. Então, eu sinto dores fortes e faço tratamento com cannabis etc, é uma doença também inflamatória e semelhado a esse ponto a uma doença inflamatória pélvica. E enfim, eu nunca enxerguei isso como a deficiência até eu ler um livro de Susan Wendel, que fala sobre deficiência de uma perspectiva feminista e ela fala sobre esses problemas, sobre essas doenças na realidade, como dor crônica, doença inflamatória pélvica, como deficiência apesar de não ser reconhecida formalmente. Então, então foi um, essa questão de ser LGBT já tinha aceitado há muito tempo, mas eu descobri que eu poderia ser considerada uma pessoa com deficiência a partir dessa óptica específica, né? Que é da segunda geração do modelo social feminista, que entende a deficiência dessa maneira. E aí, eu gosto de frisar, né? Que é óbvio que deficiência não significa doença, mas existe dentro desse segundo modelo social da geração feminista, uma perspectiva de cuidado também, né? Então, a segunda geração do modelo social, que é uma geração feminista, pensa também na deficiência a partir da Ótica do cuidado e pessoas com doenças crônicas que precisam de cuidados permanentes e etc, dentro de contextos específicos, pode ser considerados como pessoas com deficiência, né? Então esse é o meu entendimento sobre essa questão. E se eu acho que existe um duplo estigma? Com certeza existe um duplo estigma, mas no meu caso específico, não. Porque a minha deficiência não é aparente, não é uma coisa que transparece a partir de uma rápida olhada. Isso é uma questão que é mais profunda. Então, creio que se fosse uma deficiência aparente haveria um estigma muito mais pesado, mas de início não existe isso comigo por que as pessoas não sabem disso, né? Agora o que existe enquanto um estigma, né? Que acaba tendo reflexão na minha vida é porque eu sinto dores muito fortes todos os dias e já foi inclusive 24 horas. Dor por dia. Hoje eu estou bem melhor, mas eu vou ser assim para o resto da minha vida e não tem cura é crônico não tem tratamento, aliás tem alguns tratamentos mas não tem cura diminuir certas habilidades sociais, sabe? E existe um impedimento de sentido, porque eu não posso fazer tudo de que uma pessoa típica pode fazer, em vários níveis, né? Em vários, vários e vários níveis. Sobre homofobia, sim a minha família e é isso aí também, partindo para outra questão, a minha família não aceita minha sexualidade, existe muito preconceito e muitas questões já aconteceram, violência física violência psicológica, não aceitam. Então, eu já passei por situações de preconceito porque já namorei mulher e etc. E eu não sou uma pessoa dentro do armário. Sobre ser uma pessoa com deficiência dentro da minha família, não existe, as pessoas não aceitam, sabe? Quando eu trouxe essa pauta para minha mãe, por exemplo, ela achou que não tinha nada a ver uma coisa com a outra, né? Porque a visão deficiência para ela é uma coisa muito restrita. Enfim e mais pensando já partindo do pressuposto de que essa dor crônica pélvica é uma deficiência, também existe um preconceito muito grande associado a minha família. Porque a dor é em uma região especifica que na região pélvica, na região genital. Um problema, é uma doença nervosa, dos nervos da pélvis, principalmente o nervo pudendo, uma dor neuropática, inflamatória etc e muito julgamento é feito em relação a isso, não é levado a sério, sabe? E acha que é besteira. Enfim, que é porque eu fui promíscua na minha vida, porque não tem nada a ver uma coisa com a outra. E hoje em dia eu me aceito como uma mulher com deficiência, pelo fato de tudo que eu falei, né? Que eu entendo a deficiência a partir de uma perspectiva de um modelo social feminista, da segunda geração do modelo social que é feminista, que entende a deficiência não como uma patologia, não como uma coisa negativa, não como uma coisa para prejudicial, mas sim o modo de viver o mundo é o modo de vida, né? Que difere de determinadas medidas que podem diferenciar de pessoas típicas por questões de acessibilidade, de inclusão, de conhecimento e etc. Dos outros, né? E não como uma coisa negativa, mas também como conceito em evolução, como diz a convenção internacional sobre as pessoas com deficiência, que é multifacetado. Por isso, que eu compreendo que pessoas com doenças crônicas a depender, né? Do contexto específico, que se caracteriza esta doença, pode ser considerada uma pessoa com deficiência. Especialmente em termos de políticas públicas, por que essas pessoas com dores crônicas, que enfim, em determinados contextos devem ser beneficiadas de abarcadas das políticas públicas, de inclusão e acessibilidade. não é? Então, acho que um dos exemplos mais claro que a gente tem hoje em dia, que é um debate que está mais evoluído é a questão das pessoas com fibromialgia. Inclusive a fibromialgia é uma doença muito semelhante a que eu tenho, é muito semelhança de verdade, inclusive em termos de tratamento médico e etc. E aí, o reforço, né? Que ser uma pessoa com deficiência não implica em ser uma pessoa doente, não existe essa consequência lógica. Porém, algumas pessoas com doença crônicas podem ser categorizados enquanto pessoas com deficiência em determinados contextos específicos, por conta do próprio modo de vida que essas pessoas tem e levam, não é? É uma forma de estar vivendo o mundo, diferente as pessoas típicas, consideradas típicas, né? O que não significa também, pessoas consideradas normais mas pessoas típicas, que a gente usa hoje em dia né?