Sem cor na gestão
A falta de representatividade negra continua sendo um grande calo para o futebol brasileiro. Como se não bastassem os casos de racismo que ainda insistem em aparecer, dentro das quatro linhas e diante de todos os holofotes, a quantidade de pessoas negras nos bastidores ainda é muito pequena.
Entre os 20 clubes da edição de 2019 do Campeonato Brasileiro, por exemplo, apenas Goiás e Grêmio tinham departamentos de futebol comandados por negros. No time goiano, a diretoria estava a cargo do ex-volante Túlio Lustosa, que em seguida acertou com o Botafogo. Já no tricolor gaúcho, Deco Nascimento dividia o bastão com Alberto Guerra e Duda Kroeff, mas acabou sendo demitido ao final da temporada.
Com os poucos nomes disponíveis fora do mercado, a lacuna está cada vez maior. A pequena quantidade de negros em cargos de gestão conflita diretamente com a produção de craques que poderiam ocupar esse espaço. Porém, falta incentivo, espaço e, principalmente, respeito. O ex-volante Tinga iniciou sua carreira como dirigente em 2016 – na gestão de futebol do Cruzeiro. Antes disso, ele havia sido convidado por outra equipe da primeira divisão do futebol brasileiro. Nas conversas, o ex-atleta teve que lidar com o racismo velado, mas escancarado nas palavras.
“Antes de o Cruzeiro me convidar, outro clube da Série A me chamou para assumir um cargo de direção. Durante as conversas, um dirigente, que não vou revelar o nome, me pediu para cortar o cabelo. Eu tenho cabelo grande, com dread. Respondi, em tom de brincadeira, ‘você quer o meu cabelo ou o meu serviço?’. Acabei não indo trabalhar neste clube.”
Em relação aos jogadores que encerram suas carreiras e analisam o futuro dentro do esporte, a desinformação e a falsa percepção de que são necessários apenas o conhecimento e a vivência do campo também atrapalham. O futebol, como reflexo da sociedade, acaba sendo o espelho do cotidiano. Se faltam negros no topo dos organogramas, também falta combatividade aos casos de preconceito. Afinal, a bola não entra por acaso.