Enquanto a mídia e o segmento automobilístico estimulam a vida sobre quatro rodas, algumas pessoas formam uma corrente contrária e exaltam experiências “sobre dois pés”, ou seja, uma rotina em que os problemas do dia a dia são resolvidos com o simples ato de caminhar. Ainda que existam opções como transporte coletivo (ônibus, trem e metrô) em oposição ao carro particular, e até mesmo bicicletas, muitas pessoas são adeptas da caminhada como principal meio de locomoção.
É o caso de Maurício Beniacar, arquiteto e urbanista, 27 anos. Ele mora nos Aflitos e trabalha na Bomba do Heméterio. Para ir ao trabalho ele utiliza o ônibus, mas, todas as outras atividades são executadas caminhando, como ir a farmácia, mercado, bancos e outros.
“Assim que me mudei para o Recife, percebi que as pessoas aqui não caminham por medo. As ruas normalmente são desertas e a iluminação é deficiente, além de preguiça e comodidade. Uma caminhada para a farmácia mais próxima da minha residência ou para a padaria leva menos tempo do que ir de carro devido à volta que tenho de fazer para entrar na minha rua”, relata Beniacar, que vai de encontro à postura de muitos recifenses que utilizam o automóvel para ir a lugares muito próximos às suas residências.
O caso de Maurício retrata uma nova postura que muitas pessoas estão tomando nas cidades para evitar o estresse do trânsito por iniciativa própria. Entretanto, existem aqueles que ganham a vida com alguma atividade que depende do ato de caminhar.
Aelson Neves da Silva trabalha nos Correios desde 2009 e assume: “Não era a profissão que eu queria”. Com 41 anos, o carteiro argumenta que seu baixo peso e estatura não são bom aliados da profissão. “Além disso, eu tenho facilidade em perder peso. Sou carteiro por necessidade”, diz. Para enfrentar a jornada das 8h às 12h30, ele diz beber muita água e usar protetor solar. Assim como Aelson, mais de 56 mil carteiros trabalham todos os dias, segundo a Empresa de Correios e Telégrafos (ECT) caminhando muito, para entregar as milhares de correspondências que circulam pelo país.
O urbanista Maurício Beniacar fez um comparativo entre as condições de “caminhada” entre algumas capitais brasileiras e de outros países. Confira:
- Rio de Janeiro – Acompanhei a mudança que ocorreu na cidade do Rio de Janeiro na metade da década de 90. O programa Rio Cidade fez uma grande reforma e criou um novo padrão para as calçadas da cidade, assim como para a acessibilidade para os portadores de necessidades especiais (P.N.E). Porém, elas ainda podem melhorar em vários aspectos.
- Salvador – Dois dias de visita – Calçadas estreitas e mal conservadas, porém seus habitantes fazem grande uso das mesmas. Falta acessibilidade para P.N.E.
- São Paulo – Varias visitas – Calçadas de todos os tamanhos, mas, a grande maioria se encontra lisa e com acesso razoável para P.N.E.
- Londres – Quatro dias de visita – Calçadas perfeitas, largas e com tudo no seu devido lugar. Muito acessíveis aos P.N.E. Os londrinos fazem praticamente tudo com o transporte publico, portanto as calçadas são muito utilizadas.
- Buenos Aires – Quatro dias de visita – Calçadas de todas as larguras, porem sempre muito boas. Bastante utilizadas por seus habitantes com boa acessibilidade aos P.N.E.
- Israel – Um ano – Calçadas perfeitas, largas e com tudo no seu devido lugar como deve ser. Muito acessíveis aos P.N.E. Devido ao calor no verão as mesmas ficam subutilizadas.
Caminhar e trabalhar com alegria
Todos os dias, Ronaldo Nascimento, negociante, vendedor do famoso “raspa raspa tricolor”, sai do Bairro de Prazeres e caminha com o seu “carrinho” para comercializar seu produto nas areias das praias de Boa Viagem e Pina. “Vou e volto todos os dias”, ratifica.
“Conheço toda gente no caminho, moradores, turista, gente de fora, de São Paulo, Rio de Janeiro e até estrangeiro”, pontua o ambulante as vantagens de se trabalhar caminhando. Até hoje, ele nunca enfrentou nenhum problema de saúde que o tenha impossibilitado de trabalhar andando, apenas viroses.
Quando perguntado se trocaria seu veículo de trabalho por um veículo que não precisasse ser empurrado, ele foi bastante incisivo: “Jamais! O carrinho motorizado geralmente quebra, e andando é melhor pra saúde”. Ronaldo se alimenta com muitas frutas, bebe muita água e usa protetor solar. “Em casa, penduro as pernas e faço compressa para relaxar os pés.”
Para quem não gosta de caminhar, fica o recado de Ronaldo do raspa raspa: “Andar é saúde, você esquece os problemas, as mazelas da vida e não engorda”.
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Ronaldo Nascimento empurra a sua carrocinha pela orla de Boa Viagem