Dois anos de incertezas

“Meu irmão ligou para o meu esposo e contou que a Kamilly havia saído e ainda não tinha voltado. Mas, eu só fiquei sabendo um dia depois. Foi aí que eu entrei em completo desespero”, relembra muito emocionada, Adriana Rodrigues, de 28 anos, mãe de Kamilly Rodrigues, desaparecida desde o dia 7 de junho de 2011. A menina, na época com oito anos, saiu com o marido da avó, Ricardo José das Neves, para buscar um suposto prêmio do jogo do bicho que ele teria ganhado e nunca mais voltou. Nem ela nem seu avôdrastro.

Bem antes do desaparecimento, Adriana Rodrigues, seu marido Werberson Trindade, de 38 anos, sua mãe Domícia Damiana da Silva e o padrasto Ricardo José das Neves, viviam no Bairro de Brasília Teimosa. Insatisfeita com o lugar, Adriana resolveu mudar-se para o bairro do Arruda. Porém, sua filha mais velha, Kamilly, não se adaptou a nova casa e pediu para morar com a avó. Segundo Adriana, elas sempre foram muito apegadas.

A avó de Kamilly era casada com Ricardo José das Neves. Porém, seis meses antes do desaparecimento, eles estavam separados e Ricardo começou a morar no Catamarã, no bairro de Candeias, em Jaboatão dos Guararapes, no Grande Recife. Um tempo depois, a avó de Kamilly começou a frequentar a casa do marido nos finais de semana e quando a menina não ia para a casa da mãe, acompanhava a avó até a casa de Ricardo.

Não demorou muito para que o casal reatasse o relacionamento e fosse morar definitivamente no Catamarã. “No começo eu tentei fazer com que Kamilly viesse morar comigo, mas ela não quis. Então, deixei ela morar com a minha mãe, iria tentar trazê-la de novo, mas não deu tempo”. A estada da pequena no novo endereço só durou 13 dias.

Desaparecimento
No dia 7 de junho de 2011, por volta dás 11h30, o avôdrastro da garota foi buscá-la na escola. Como de costume, Adriana ligou para Ricardo pedindo para falar com a filha. “Ela me disse que eu não precisava comprar seu vestidinho de São João porque o Ricardo havia ganhado um dinheiro. Eu desconfiei, então, falei com ela e, em seguida pedi, para falar com Ricardo”, relembra.

Foi naquele momento que a vida de Adriana começou a  mudar radicalmente. O avôdastro da garota contou ter ganhado no jogo do bicho e, por isso, iria comprar o vestido de Kamilly. Ele também contou a Adriana que pretendia pegar a quantia em dinheiro naquela tarde. Ainda no dia 7, às 14h30, Adriana voltou a ligar para Ricardo, só que dessa vez, um comportamento diferente fez ela desconfiar seriamente que alguma coisa estava para acontecer.

“Liguei para ele e perguntei sobre Kamilly. Ele, nervoso, disse que estava tudo bem e tinham ido pegar o prêmio. Naquele momento achei muito estranho ele não ter passado o telefone para a menina, como sempre fazia”, relembra a mãe da garota. Já às 15h30, ela voltou a ligar, mas dessa vez, Ricardo não a atendeu. Desde então, ela não teve notícias nem da filha, nem de Ricardo. Ambos sumiram sem deixar pistas.

Notícia
Tentando privar Adriana da forte emoção, pois ela estava grávida de seis meses da sua filha caçula, sua família omitiu a notícia até à tarde da quarta-feira, 8 de junho. A cunhada de Adriana ligou para ela e a convidou para almoçar, o intuito era tentar contar o acontecido de forma menos danosa para a mãe.

Logo que chegou, Adriana se surpreendeu ao perceber que tanto o seu marido, quanto o seu cunhado também estavam presentes. Eles começaram a conversar e sua cunhada disparou a notícia, ninguém sabia do paradeiro de Ricardo e Kamilly.

A busca
O primeiro passo foi dado pela avó da garota, que foi até a delegacia de Candeias registrar um Boletim de Ocorrência (B.O). Depois, Adriana foi até à Gerência de Polícia da Criança e do Adolescente (GPCA) e também prestou uma ocorrência.

Não satisfeita, Adriana começou a procurar por conta própria. Inicialmente, ela foi até o Instituto Médico Legal (IML), depois ao Hospital da Restauração (HR). Inconformada, ela enxergou na imprensa a chance de divulgar o caso. Em programas de televisão, fez apelos à sociedade para encontrar sua filha.

E foi através da televisão que Adriana pediu para que a delegada Gleide Ângelo, do Departamento de Proteção a Pessoa (DHPP), tomasse conta do caso. “Eu procurei a delegada porque eu vi o desfecho do desaparecimento do menino Lucas Kauã e fiquei com esperança que ela também conseguisse encontrar Kamilly”, relembra. O caso de Lucas Kauã repercutiu nacionalmente. O garoto desapareceu no dia 4 de setembro de 2010, nas proximidades da Estação do Metrô Joana Bezerra. Gleide Ângelo assumiu o caso a pedido do secretário de Defesa Social, Wilson Damázio e conseguiu solucioná-lo.

Esgotando todas as possibilidades de encontrar sua pequena, Adriana reuniu familiares, amigos e pessoas próximas para fazer uma passeata. Com uma camisa que traz a foto da garota estampada, eles caminharam pelo bairro do Pina. Por fim, usou a campanha feita através da novela “Amor Eterno Amor”, exibida pela Rede Globo, para divulgar a imagem da criança. Além disso, publicou a foto de  Kamilly  no jornal da Igreja Universal, que possui circulação nacional.

Rosto da jovem é divulgado em campanha nacional (Fonte: Acervo Rede Globo)

Recentemente a mãe da pequena Kamilly foi informada pela delegada Gleide Ângelo que no Rio de Janeiro estava sendo feita uma campanha para encontrar pessoas desaparecidas e que fotos de Kamilly também estavam sendo divulgadas. “Nesse tempo muita coisa passa pela cabeça da gente. A minha mãe tem muita esperança de encontrar, mas infelizmente, eu não tenho mais. Isso é uma coisa que me magoa muito”, desabafa Adriana.

Muito ajuda quem não atrapalha
Com a grande divulgação do caso, e, sobretudo, com os cartazes que tinham os telefones dos familiares de Kamilly, sua família começou a receber uma grande quantidade de trotes. Eram pessoas de todos os lugares, ligando e passando falsas informações sobre o paradeiro da menina.

O primeiro trote foi feito por um rapaz que disse ter visto Ricardo em um ônibus e que, inclusive, teria falado com ele. Depois, outra ligação falando que a menina estava em Boa Viagem.

Recentemente, a família da garota recebeu uma ligação de uma criança que entrou em contato dizendo estar com Kamilly. A polícia conseguiu identificar o aparelho que fez a ligação. Era um orelhão, localizado no Bairro de Afogados.

Toda vez que o telefone toca uma nova esperança surge, mas quando percebem que  não passa de uma grande mentira, a decepção e o desespero tornam a assombrar a família.

Saudade
A saudade é grande. Isso pode ser visto claramente nos olhos de todos que falam da pequena Kamilly. Seu irmão do meio, Axberg Aquiles, de apenas 5 anos, completou a mãe diversas vezes enquanto ela falava com a equipe de reportagem. Na cozinha, a mãe exibe emoldurada a última foto de Kamilly. Foi o último Ano novo que a menina passou com a família.

Descrita pela mãe como alegre, Kamilly fará 11 anos no mês de setembro. Mesmo sem saber absolutamente nada do paradeiro da menina, Adriana imagina como sua filha deve estar grande e tem em mente que, apesar de ter desaparecido há muito tempo, não deve ter mudado muito. “Tudo o que eu quero é ela viva, porque a vida a gente não recupera. Eu queria ela viva”, reforça, emocionada.

 

 

 

 

 

 

 

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