O futebol foi a primeira paixão que dividi com o meu irmão, quando eu tinha quatro anos e ele, seis. Vivemos em uma família apaixonada por esportes, dos menos conhecidos aos mais populares. Mas foi João o responsável pelo primeiro contato que tive com a bola e os primeiros ensinamentos, antes mesmo de compartilharmos o mesmo time na escola (e na vida, com o Sport Club do Recife).
A gente trocou chuteiras e camisas. Nós não tínhamos tanto em comum, mas eu queria copiar tudo aquilo que você fazia, em qualquer esporte que você estivesse. Era pura admiração, João.


Em casa a gente fazia bagunça. Jogávamos futebol no terraço todos os dias depois do jantar, até que, em uma das nossas partidas mais acirradas, acertamos o jogo de copos de cristal de vovó. O nosso estádio caseiro foi interditado eternamente.
Mas isso não bastou, porque nós já dividíamos o time – inteiramente masculino – no colégio. Lembra do professor Tiago? A gente adorava ele, acho que foi o primeiro treinador que tivemos (ou será que foi Bruno?). Lembro que todos os gols que fiz eu dediquei a mainha, que nos assistia da arquibancada, vibrante e com lágrimas nos olhos, quase sempre. Era uma das poucas mães que acompanhavam a rotina dos filhos no futebol, principalmente quando eram dois, entre eles, uma menina.

A idade foi passando e eu não pude mais participar do mesmo time que você. Já não era mais seguro, aos 12 anos, dividir a quadra com os meninos.
Não foi o fim da nossa dupla, já que até hoje jogamos juntos nos encontros da família. Mas eu precisei encontrar um novo espaço para ocupar.
Mainha me levou até o Sport para tentar uma vaga naquela peneira – bem rasa, por sinal. Éramos tantas e as vagas eram quase inexistentes. Sonhávamos em nos tornar jogadoras profissionais, mas os espaços para meninas jogarem futebol no Recife eram escassos, como ainda hoje são. Tive que esperar.
Aos 13, parada depois de um ano sem disputar campeonatos escolares e nem mesmo participar de treinos, veio a esperança: um time só de meninas, no colégio. Foi melhor que um sonho.
Lembro do quanto eu me esforçava para estar lá na quadra do Salesiano durante a tarde, duas vezes por semana. Era um time incrível. Dudinha, Juliana, Katherin, Kallyne, Raphaella e tantas outras que dividiram a quadra Dom Bosco sob a batuta do nosso treinador e amigo Gileno Siqueira.
E assim fomos disputar o tão amado Nordestão Salesiano, no qual conquistamos o segundo lugar. Voltamos com a medalha de prata e com um novo desafio: formar uma nova equipe, já que a maioria do grupo estava concluindo o Ensino Médio.
Assim fizemos. Eu permaneci na equipe com Katherin, que me ajudou a chamar outras amigas, como Maria, Flávia, Thamara e sua irmã, Rayane. Disputamos novamente o Nordestão Salesiano e, naquele ano, eu fui escolhida para ser a capitã do time. Foi linda a nossa dedicação. Voltamos para casa, mais uma vez, com a medalha de prata.


Aquele foi o último campeonato que disputei, já que o time feminino se desfez. Passei anos distante da modalidade, mas eu continuava inspirada, assistindo todos aqueles jogos com Marta, Formiga e Cristiane. Acompanhava a conterrânea Bárbara e sua atuação na seleção. O esporte nunca me abandonou, mesmo eu o tendo perdido de vista.
O destino e o futebol não se cruzam por acaso e eu precisava reencontrar esse caminho. Da mesma forma que “escolhi” cursar Jornalismo – por uma sugestão de mainha –, a minha última participação na universidade não poderia ser finalizada sem falar sobre um dos capítulos mais importantes da minha vida. E é por isso que eu concluo este texto deixando uma frase que a minha mãe, Ana Lúcia, me falou quando eu ainda escolhia o tema deste trabalho: “Você deve uma matéria ao futebol feminino e esse é o seu legado para a categoria”. Aqui, fora das quadras e dos textos, eu sigo torcendo nos estádios. Obrigada, família. Obrigada, futebol. Vocês me trouxeram até aqui!