"Trânsito é vida" é o cordel escrito pela professora Rivani Nasario para ensinar as regras do tráfego aos seus alunos.

“Trânsito é vida” é o cordel da professora Rivani Nasario ensina as regras do tráfego 

Rima, métrica e oração. Elementos não só encontrados na literatura de cordel, mas também nas salas de aula. O livreto para fazer críticas e informar o povo agora já pode ser usado como ferramenta de apoio na educação e na construção de textos didáticos. Foi assim, na ponta do lápis de estudantes, que a cultura popular encontrou um espaço para ser disseminada. Enquanto no Recife, uma professora acredita que o folheto consegue alfabetizar os alunos, em Caruaru, no Agreste do Estado, a ideia é transformar os alunos em cordelistas. Nas duas cidades o objetivo é o mesmo: popularizar a rica literatura popular, que não costumava ser usada pelos alunos.

 

Conhecido como Cordel nas escolas, o projeto desenvolvido por um grupo de poetas e emboladores teve o apoio da Secretaria de Educação de Caruaru e foi muito bem recebido nas unidades de ensino. O projeto visa incentivar os jovens estudantes a se aproximarem mais dessa manifestação cultural e ajudar no resgate, na perpetuação da história e cultura do cordel no município. Os alunos são motivados a construir um livreto. Primeiro, desenvolvem o fato que vão relatar. Na maioria das vezes, escolhem assuntos atuais, do cotidiano e presentes na mídia. Com o tema definido, os arte-educadores ensinam a transformar a ideia em cordel.

 

Durante as aulas quatro segmentos artísticos são trabalhados: poética, musicalidade, teatralidade e desenho. Os estudantes escrevem um folheto com métricas e desenho. Com o texto elaborado, criam uma peça e uma música sobre aquele cordel. Alunos – tanto da zona urbana quanto da rural – são privilegiados com as apresentações que acontecem durante um ano inteiro. O projeto atende de cinco a sete instituições por ano para que todas possam ser contempladas.

 

Nelson Lima, arte-educador do projeto desde que foi criado em 2007, garante que é gratificante voltar às salas de aula e ver o interesse dos estudantes. “Temos o aluno da escola Pedro de Souza, José Antônio, que hoje é um profissional do cordel e xilogravura. Já Ana Paula, que estuda na Mestre Vitalino, é declamadora”, ressalta, com orgulho. O professor ainda explica que tudo pode ser ensinado através desta técnica.

 

Outra iniciativa do projeto foi produzir algumas notícias do que acontece na escola em formato de cordel. Veja o informativo na integra.

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PROFELISTAS = PROFESSORES CORDELISTAS

 

Na sala de aula da Escola municipal Pedro de Souza, em Caruaru, o pedagogo Dorge Tabosa, 45 anos, ensina história e geografia com a ajuda da literatura de cordel. Poeta por influência dos avós, cresceu escutando os repentes e decidiu introduzi-los na sala de aula. Por se identificar como “poeta de bancada” ele escreve os cordéis, mas não costuma declamar. Diferente de seu filho Alisson, que é vendedor de sapatos, mas nas horas vagas tem o dom de recitar as rimas dos livretos. “Quando ele era criança se juntava com as irmãs para fazer shows de embolada”, lembra o pai.

 

A filha, Jéssica Letícia de 18 anos, acabou de passar no vestibular de pedagogia na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Para ela, usar os folhetos no colégio é uma forma de valorizar a cultura nordestina. “É uma maneira fácil de aprender”, conta a jovem, concordando com o pai quando ele diz que o poder de síntese da literatura de cordel é o ponto chave da técnica.

 

Já no Recife, o projeto Cordel na sala de aula, da União dos Cordelistas de Pernambuco (Unicordel) também garante a cultura dos livretos na sala de aula. A iniciativa é coordenada pelo professor de história e poeta Paulo Moura. “Explicamos como o cordel chegou no Brasil, influências e heranças europeias, além dos estilos diferenciados”, indica. Moura ressalta que muitos alunos só precisam daquela ‘forcinha’ para desenvolver o talento de escrever ou recitar a poesia do cordel. Em parceria com as aulas de português, os garotos passam a assimilar o assunto cultural junto com as regras didáticas da língua do povo brasileiro. A iniciativa foi muito bem aceita nas escolas e já garantiu o prêmio Patativa do Assaré de Literatura de Cordel do Ministério da Cultura.

 

O escritor Abdias Campos, apesar de não ser cordelista, também desenvolveu maneiras de incentivar o hábito pela leitura dos livretos nos pequenos. “Sou escritor que utilizo a literatura de cordel porque tem um poder de síntese incrível”, ressalta. Campos desenvolveu um kit infantil chamado Meu cordelzinho de histórias, com oito livrinhos e um audiolivro. As obras abordam temas voltados para a ética, pluralidade cultural, saúde e meio ambiente em uma linguagem lúdica para que as crianças possam compreender a mensagem. “Uma vez, uma mãe me agradeceu a história que criei do dentinho de leite – que está no kit – porque a partir da historinha a filha dela não esquece mais de escovar os dentes.” No audiolivro, o autor ainda dá algumas sugestões pedagógicas para os docentes usarem os cordéis com assuntos curriculares.

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Em Olinda, o cordel também é usado para alfabetizar as crianças. A iniciativa surgiu da professora Rivani Nasário, que pensa no cordel não apenas como críticas sobre os acontecimentos cotidianos, mas também como fortalecedor da leitura e da escrita. Vestida com roupas típicas dos antigos cangaceiros, Rivani resgata a cultura do Nordeste e prova que o gênero está aliado à educação. A “cangaceira do cordel” mostra para os alunos como unir letras e formar frases,  com a ajuda da métrica do cordel.

 

Para a professora, o processo de alfabetização deve ser agradável como uma brincadeira. Por isso, ensina o alfabeto através da declamação. “A cantoria alfabetiza, a peça de teatro também. No ano passado, por exemplo, trabalhei Luiz Gonzaga e um pouco do Sertão. Este ano, Vinicius de Moraes e alimentação saudável. Tudo em estrofes de cordel declamado e musicado. Este é o processo de alfabetização”, ressalta. Em 2006, trabalhou na Escola Pro Menor onde deu uma oficina gratuita para 26 alunos e, atualmente, leciona na Escola Misael Montenegro Filho, também em Olinda.

 

3 Responses so far.

  1. Nelson Lima disse:

    Poxa! Não sabia que ia ficar tão bem feito…Parabéns.

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