Na Ilha do Maruim, em Olinda, as noites ganham vida ao som dos bailes improvisados nas vielas estreitas. É lá que Ykaro MC, 22 anos, faz ecoar sua voz entre as palafitas da favela, onde as batidas do funk e do rap são trilha sonora de vidas que misturam resistência e sonho. Ele não é um nome grande do cenário musical — ainda. Mas suas letras carregam uma potência genuína, fruto de uma realidade que transforma um boné da Cyclone, um tênis ou um chinelo Kenner em algo muito maior do que moda: um símbolo de pertencimento e dignidade.
“Na comunidade, quando você bota uma roupa dessas, é como se você fosse alguém. Parece besteira, mas é autoestima. É mostrar pra si mesmo que você vale algo”, explica Ykaro, com o sorriso tímido de quem sabe bem o peso das palavras que canta.

Os números da vida real
A Ilha do Maruim não aparece nos mapas turísticos de Olinda, mas é casa para milhares de famílias que enfrentam a dureza da exclusão social. Segundo o IBGE (2022), mais de 50% dos moradores vivem abaixo da linha da pobreza, e o desemprego entre jovens ultrapassa 30%. Muitos recorrem a trabalhos informais para ajudar em casa, como Ykaro, que começou a entregar quentinhas com a mãe ainda criança.
Essa realidade faz com que sonhos de consumo ganhem outro significado. Na Ilha, uma peça de roupa de marca não é apenas uma questão de estilo. “Quando eu era mais novo, via os caras mais velhos do bairro andando com aquelas camisetas da Cyclone e sonhava ter uma. Pra mim, era coisa de quem já tinha chegado lá”, conta o MC.


De Cyclone a Kenner: a moda que empodera
Se para o mercado global marcas como Kenner são só produtos, nas periferias do Nordeste elas carregam um valor que ultrapassa o material. A Cyclone, em particular, voltou a ganhar força na comunidade, com suas estampas chamativas e cortes largos. Para Ykaro e seus amigos, vestir essas peças é mais do que acompanhar uma tendência: é conquistar um espaço simbólico em um mundo que os ignora.
Mais que consumo: autoestima e sobrevivência
Apesar da força simbólica dessas marcas, Ykaro sabe que autoestima não vem só de roupa cara. “Pode ter o tênis mais bonito, mas se você não tá bem por dentro, não adianta. Por isso, minha música é pra lembrar que a gente pode mais. A favela merece acreditar.”
Sonho grande, passos pequenos


Ykaro MC ainda não é um nome reconhecido fora das vielas da Ilha do Maruim. Mas, para ele, o sucesso não é só sobre fama ou milhões de visualizações. É sobre inspirar outros jovens a acreditarem em si mesmos, mesmo quando tudo parece conspirar contra.
“Eu tô começando agora, mas sei que minha música já tá chegando em quem precisa. Se o moleque ouvir meu som e pensar ‘se ele conseguiu, eu também consigo’, já valeu a pena.”
Na Ilha do Maruim, onde os sonhos dividem espaço com a dureza do cotidiano, Ykaro segue firme.